Exposição "Legado", de Ayrson Heráclito, Emanoel Araujo e Mestre Didi
Exposição

Exposição "Legado", de Ayrson Heráclito, Emanoel Araujo e Mestre Didi

Exposição

  • Nome: Exposição "Legado", de Ayrson Heráclito, Emanoel Araujo e Mestre Didi
  • Abertura: 13 de março 2025
  • Visitação: até 26 de abril 2025

Local

  • Local: Simões de Assis
  • Evento Online: Não
  • Endereço: Al. carlos de carvalho, 2173 A

Legado: Ayrson Heráclito, Emanoel Araujo & Mestre Didi

curadoria Daniel Rangel



Uma tríplice aliança yorubaiana1


Para a cultura iorubá, o tempo é um evento circular. Passado, presente e futuro se confundem e entrelaçam entre si. A Bahia, terra mãe do Brasil, foi também o porto de chegada da cultura iorubana. Provinda sobretudo da Nigéria, mas também do Benin e do norte do Togo, o iorubá é a etnia mais presente em Salvador, no dia a dia das pessoas e também nos principais terreiros de candomblé da cidade, por exemplo. Essa presença veêm sendo abordada por artistas de diferentes gerações e estilos desde o final dos anos 1940, começo dos 1950, quando podemos perceber um afloramento de um movimento moderno genuinamente baiano. Não somente pela incorporação de temáticas relacionadas à presença da cultura afrodiaspórica – sobretudo na capital e na o recôncavo baiano –, mas também pela inserção de referências da cultura popular relacionada ao barro, à terra, ao couro; referenciais dos povos indígenas; e ainda uma presença de artistas afrobrasileiros abordando sua própria cultura.


A exposição Legado: Mestre Didi, Emanoel Araújo e Ayrson Heráclito reúne justamente três baianos expoentes máximos dessa tradição. Diferentes tempos reunidos em um mesmo espaço que vai além de uma conexão evidentemente cronológica, cuja existência é real. A contribuição aqui é de todos para todos, como em uma encruzilhada. É fato que Mestre Didi (1917 - 2013) influenciou Emanoel Araújo (1940 - 2022) e que ambos influenciaram Ayrson Heráclito (1968). No entanto, é verdade também que a contribuição aqui acontece em três vias, como em uma via de mão- tripla onde caminhos se cruzam e fortalecem as estradas individuais. Se a trajetória vanguardista de Mestre Didi pavimentou o caminho para Emanoel Araújo, este consolidou a estrada. Não somente com sua produção como artista, mas sobretudo com seu trabalho como curador e introdutor da arte negra no circuito artístico nacional. De fato, Ayrson Heráclito atualmente transita nessa estrada, no entanto, vem ampliando gradativamente o alcance desse legado para ele e para os outros, sobretudo a nível internacional.


Simultaneamente à abertura dessa exposição em Curitiba, o Museo del Barrio em Nova York inaugurou a primeira grande mostra individual do Mestre Didi fora do Brasil. Ayrson foi um dos curadores2 desse projeto que, de certa forma, está apresentando ao sistema de arte internacional essa produção única de origem “yorubaiana”. Didi, além de artista, foi um grande sacerdote do candomblé, sendo filho sanguíneo de Mãe Senhora, uma das mais importantes ialorixás da Bahia, que também foi mãe-de- santo de Jorge Amado, Pierre Verger e Carybé. Sua produção escultórica representa símbolos, cores e formas das ferramentas, ícones, animais, folhas e materiais provindos do candomblé. Obras de taliscas de dendê trançadas, que fazem referência direta ao Ibiri – uma ferramenta da orixá Nanã que o artista ressignificou com grande liberdade formal e, também, espiritual. Mestre Didi criou inúmeras dessas esculturas, “totens” energéticos, com variações cromáticas e distintos tamanhos. É evidente que as obras dele dialogam diretamente com a produção aqui apresentada por Ayrson Heráclito, sendo a série Juntó uma homenagem ao Mestre Didi.


Ayrson Heráclito (Macaúbas, 1968). É artista, professor e curador. Possui doutorado em Comunicação e Semiótica pela PUC São Paulo, e mestrado em Artes Visuais pela UFBA. Com um olhar particular, a obra de Heráclito evidencia as raízes afro-brasileiras e seus elementos sagrados, projetando ações e práticas que compõem a história e a cultura da população negra.


Seus trabalhos transitam entre instalações, performances, fotografias e produções audiovisuais que lidam com as conexões entre o continente africano e as diásporas negras nas Américas. O corpo é um elemento central de sua pesquisa, empregando referências rituais, principalmente do candomblé, como dendê, carne, açúcar e sangue, buscando relacioná- los ao patrimônio histórico e arquitetônico ligado ao comércio escravista. Entre 2008 e 2011, produziu a série intitulada Bori, que significa oferenda à cabeça. A performance apresenta uma espécie de rito em que Heráclito oferece a comida sacrificial ligada a cada um dos 12 principais orixás. São utilizados alimentos como milho, pipoca, quiabo, arroz e fava, colocados em torno da cabeça de cada performer, que estão deitados em esteiras de palha e vestidos com roupas brancas.


Outro importante marco na carreira do artista foi Transmutação da Carne, iniciado em 1994. A obra surgiu a partir de um documento que descreve as torturas cometidas pelos senhores de engenho contra os escravizados. Em 2015, Heráclito reapresentou Transmutação da Carne durante a exposição Terra Comunal, da artista sérvia Marina Abramović (1946), no Sesc Pompéia, em São Paulo. Uma de suas principais pesquisas é Sacudimentos, sobre o tráfico negreiro entre a Bahia e o Senegal, realizada em 2015 e apresentada na 57a Bienal de Veneza (2017). Composta por vídeos e fotografias, a obra é construída a partir de rituais de limpeza da Casa dos Escravos na Ilha de Goré e de um grande engenho de açúcar no Brasil, exorcizando os fantasmas da colonização.


O artista participou da 16a Bienal de Sharjah (2025), Emirados Árabes; After the End of the World: Pictures from Panafrica (2024), The Art Institute of Chicago, EUA; 57a Bienal de Veneza (2017), na Itália; da Bienal de fotografia de Bamako no Mali (2015) e da Trienal de Luanda em Angola (2010). Em 2022, teve uma grande exposição individual, “Ayrson Heráclito: Yorùbáiano”, que contemplou décadas de produção na Estação Pinacoteca, em São Paulo. Foi um dos curadores-chefes da 3a Bienal da Bahia, curador convidado do núcleo “Rotas e Transes: Áfricas, Jamaica e Bahia” no projeto Histórias Afro- Atlânticas no MASP, que esteve em cartaz no MASP e no Instituto Tomie Ohtake, em São Paulo, em 2018. Recebeu o prêmio de Residência Artística em Dakar do Sesc_Videobrasil e a Raw Material Company, Senegal. Possui obras em acervos do Museu Solomon R. Guggenheim, Nova York; Musem der Weltkulturen, Frankfurt; MAR - Museu de Arte do Rio; Museu de Arte Moderna da Bahia, Salvador; MON, Curitiba; Videobrasil e Coleção Itaú.


Emanoel Araujo (Santo Amaro da Purificação, Brasil, 1940 - São Paulo, Brasil, 2022) foi um dos mais relevantes artistas brasileiros, além de curador, colecionador e museólogo. Baiano, nasceu numa tradicional família de ourives. Foi na oficina do marceneiro e entalhador Eufrásio Vargas que, ainda na puberdade, começou a desenvolver seus trabalhos e aprendeu a trabalhar com a madeira. Muito jovem, aos 13 anos, mergulhou no universo gráfico como funcionário da Imprensa Oficial de sua cidade. Em 1959, realizou sua primeira exposição individual, ainda em sua terra natal. Mudou-se para Salvador na década de 1960 e ingressou na Escola de Belas Artes da Bahia (UFBA), onde estudou gravura.


A partir de 1971, realizou obras abstratas, compostas por formas geométricas conjugadas. O artista gradualmente passou a aproximar-se das vertentes construtivas, reduzindo as figuras a estruturas primárias. Desenvolveu trabalhos que contêm segmentos ondulados de outras gravuras, colados sobre o plano de uma gravura maior, resultando em cortes, interferências e justaposições – assim, essa produção já apontava seu interesse pelo tridimensional. Interessado na reestruturação do universo da arte e da cultura afro-brasileira, enfatizava em suas gravuras, relevos e esculturas as formas e volumes geométricos aliados a contrastes acirrados, ângulos marcados e cores fortes.


Araujo já expôs em diversas galerias e mostras nacionais e internacionais, somando cerca de 50 exposições individuais e mais de 150 coletivas. Foi premiado com medalha de ouro na 3a Bienal Gráfica de Florença, Itália, em 1972. No ano seguinte, recebeu o prêmio da Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA) de melhor gravador, e, em 1983, o de melhor escultor. Foi diretor do Museu de Arte da Bahia entre 1981 e 1983, além de ter lecionado artes gráficas e escultura no Arts College, na The City University of New York (1988). Em 2023 Araujo integrou a seleção de artistas da 35a Bienal de São Paulo - coreografias do impossível.


Foi diretor da Pinacoteca do Estado de São Paulo (1992-2002) e fundador do Museu Afro Brasil (2004), atuando como Diretor Curador da instituição até seu falecimento. Em 2005, exerceu o cargo de Secretário Municipal de Cultura e, em 2007, foi homenageado pelo Instituto Tomie Ohtake com a exposição “Autobiografia do Gesto”, que reuniu 45 anos de sua produção. Realizou três mostras individuais no MASP: a primeira em 1981; a segunda, em 1987, intitulada “Esculturas em Grandes Formatos”; e a terceira, em 2018, no contexto do ano dedicado às histórias afro- atlânticas no museu, nomeada “A Ancestralidade dos Símbolos: África-Brasil”. Emanoel Araujo faleceu em São Paulo em 2022, aos 81 anos.


Possui obras em coleções importantes como LACMA, Los Angeles; Art Institute of Chicago; MFA Boston; Dallas Museum of Art; Tate Modern, Londres; Museu de Arte da Bahia, Salvador; Museu de Arte Moderna da Bahia, Salvador; Museu de Arte Moderna, Rio de Janeiro; Rockefeller Foundation, Nova York; Museu de Arte Contemporânea, São Paulo; Museum of Sydney; MASP - Museu de Arte São Paulo; Museu de Arte de Brasília; Palácio do Itamaraty, Brasília; Museu Nacional de Belas Artes, Rio de Janeiro; Museu Brennand, Recife; Museu do Estado de Pernambuco, Recife; Pinacoteca do Estado de São Paulo; e Museu Afro Brasil, São Paulo.


Deoscóredes Maximiliano dos Santos (Salvador, Bahia, 1917-2013), mais conhecido como Mestre Didi, foi um sacerdote-artista – termo amplamente empregado por Juana Elbein dos Santos, antropóloga que foi sua companheira e que extensamente escreveu sobre sua vida e obra. Filho de um grande alfaiate baiano, Arsênio dos Santos, e de Maria Bibiana do Espírito Santo, conhecida como “Mãe Senhora” por seu papel de Ialorixá no terreiro Ilê Axé Opô Afonjá, Didi começou ainda na infância a executar objetos rituais associados ao Candomblé, mantendo essa prática ao longo de toda sua vida. Ao mesmo tempo, iniciou-se na religião ainda aos oito anos de idade, aprofundando-se no culto aos Egunguns (ou Ancestrais), parte essencial da cultura nagô de origem iorubana.


Foi a partir dessa combinação precoce de saberes que aprendeu a manipular com maestria os materiais simbólicos que compõem suas obras: nervuras e palhas de palmeiras, conchas, búzios, contas e miçangas, além de tiras de couro e tecido. Didi articulava esses elementos por meio das técnicas tradicionais que aprendera junto aos praticantes mais antigos do culto ao orixá Obaluaiê, ao qual também se dedicava pessoalmente. Contudo, empregava uma linguagem contemporânea que traduzia para o presente toda uma potente e profunda cosmogonia ancestral. Suas esculturas são manifestações fundamentais da ressignificação simbólica da espiritualidade na arte, sínteses de antigos saberes e expressões atuais de experiências do sagrado: resgatam mitologias por meio de novas estéticas, unem abstração e figuração, entrelaçam o sagrado e o profano, são alegóricas e literais, e vivificam uma religiosidade afro-brasileira que também pode ser universal. Seu trabalho, em suma, consubstancia as relações entre o homem e o sumo sacerdote do Panteão da Terra1 que detém o espírito íntimo das coisas.


Entre 1946 e 1989, Mestre Didi publicou livros sobre a cultura afro-brasileira, alguns deles ilustrados pelo artista Carybé. Em 1966, viajou para a África Ocidental para realizar pesquisas comparativas entre Brasil e África, contratado pela Unesco. Nas décadas de 1960 a 1990, participou como membro de institutos de estudos africanos e afro-brasileiros e, como conselheiro em congressos com a mesma temática, no Brasil e no exterior, promovendo amplamente a cultura afro-brasileira. Em 1980, fundou e presidiu a Sociedade Cultural e Religiosa Ilê Asipá do culto aos ancestrais Egun, em Salvador. Foi coordenador do Conselho Religioso do Instituto Nacional da Tradição e Cultura Afro-Brasileira, representando no país a Conferência Internacional da Tradição dos Orixás e Cultura.


Mestre Didi já realizou de importantes mostras individuais e coletivas em instituições como Pinacoteca do Estado de São Paulo, Museu Afro Brasil, Museu de Arte Moderna de São Paulo; Museu Oscar Niemeyer, Curitiba; Museu de Arte Moderna da Bahia, Salvador; Museu Histórico Nacional e Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, além de figurar na Bienal da Bahia e na 23a Bienal de São Paulo. No exterior, expôs em Valência, Milão, Frankfurt, Londres, Paris, Acra, Dacar, Miami, Nova York e Washington. Seus trabalhos figuram em coleções de destaque, incluindo Bass Museum of Art, Museu de Arte Moderna da Bahia, Museu de Arte Moderna de São Paulo, e Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand.



Serviço


Legado: Ayrson Heráclito, Emanoel Araujo & Mestre Didi

curadoria Daniel Rangel

Curitiba

abertura: 13 de março, quinta-feira, 18h às 21h 

13.03 - 26.04.2025

al. carlos de carvalho, 2173 A 80730-200 pr brasil

+55 41 3232-2315

simoesdeassis.com

@simoesdeassis_

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