Exposição “Hal Wildson – Re-Utopya”
Exposição
- Nome: Exposição “Hal Wildson – Re-Utopya”
- Abertura: 09 de junho 2022
- Visitação: até 30 de julho 2022
Local
- Local: Galeria Movimento
- Evento Online: Não
- Endereço: Rua dos Oitis, 15, Gávea, CEP 22451-050, Rio de Janeiro, RJ
A Galeria Movimento apresenta a exposição
“Hal Wildson – Re-Utopya”
Conhecido principalmente por seu
trabalho com imagens criadas a partir de uma datilografia extrema, o artista e
poeta investiga a história do Brasil, onde memória, esquecimento, identidade e
a palavra são suas ferramentas para pensar em um futuro possível para o país, e
para o povo brasileiro, “ainda em formação”. Esta primeira grande individual do
artista nascido em 1991 no Vale do Araguaia, região de fronteira entre
Goiás e Mato Grosso, e atualmente morando em São Paulo, reunirá sua
produção inédita e recente, em vários suportes. Símbolos nacionais, máquina de
escrever, digitais, primeiros registros históricos do povo brasileiro são
usados neste processo crítico que compõe sua poética.
Galeria Movimento,
Gávea, Rio de Janeiro
Abertura: 9 de junho de
2022, das 18h às 21h
Até: 30 de julho de 2022
Texto crítico: Divino
Sobral
Entrada gratuita
Apoio:
Becks
A Galeria Movimento apresenta
a partir do dia 9 de junho de 2022,
das 18h às 21h, a exposição “Re-Utopya”,
com obras recentes e inéditas do artista Hal
Wildson, nascido em 1991 no Vale do
Araguaia, região de fronteira entre Goiás e Mato Grosso, e atualmente
morando em São Paulo. Acompanha a exposição um texto crítico do curador Divino Sobral.
Embora seja a primeira individual de Hal Wildson, seu
trabalho já pode de alguma forma soar familiar para o grande público. Sua obra “República da Desigualdade – Meritocracia
seja Louvada” (2018-2020) foi vista em rede nacional na abertura do
documentário especial “Mães do Brasil”,
produzido pela Favela Filmes e KondZilla Filmes, com direção de
Kelly Castilho e John Oliveira, eexibida pela Globo em dezembro. Naquele
trabalho, imagens de arquivos nacionais de trabalhadores brasileiros,
fotografia autoral e registros da infância do artista são plasmadas em notas de
“zero real”.
E um vídeo poético seu,feito durante o processo de criaçãoda obra “Singularidades” (2020/2022),
viralizou, e alcançou a marca de mais de cinco
milhões de visualizações no Instagram, sendo compartilhado também por
artistas, como Vik Muniz. O vídeo
postado em sua página era acompanhado de um pequeno texto: “Existe em nós um
Brasil que vale a pena acreditar! Somos um povo que nasce e se encontra no
desencontro das suas multiplicidades, que ultrapassa o tempo em processo de
construir e fazer a si mesmo. Existe em nós muitos de nós, Brasis em construção
e reconstrução, e é por acreditar que faço da minha arte uma semente de
esperança, um martelo que quebra, um tijolo que constrói. Singularidade, Brasil, identidade”. “Foi surpreendente”, comenta Hal Wildson, “porque pessoas de vários
países se conectavam com a poesia do trabalho. Cada um em seu lugar, mas todo
mundo sente alguma coisa. Estou falando de ser humano, de nossa origem”.
A obra “Singularidades”
estará na exposição. É composta por 441
digitais do artista em tamanho real,
coletadas no ateliê, nas marcas deixadas durante a produção do trabalho. E cada
digital se mistura a um registro
histórico do povo brasileiro – mestiços, como o próprio artista, indígenas,
negros – de arquivos nacionais, coletados na internet. “São retratos de
identidade do Brasil que nos ajudam a olhar nossa história”, diz. “Este
trabalho surge desta vontade, deste desejo de entender para onde vai o povo brasileiro. Em momento de crise – crise na
saúde, crise na democracia, crise institucional, crise dos símbolos – como reconstruir o Brasil se o próprio povo
não se reconhece mais? Se o próprio povo não sabe que existe possibilidade de
um futuro?”, indaga.
NINGUENDADE E
NINGUENTUDE
Companheiro inseparável do artista há dois anos é o livro “O povo
Brasileiro: a formação
e o sentido do Brasil” (Companhia das Letras,
1995), de Darcy Ribeiro (1922-1997).
“Este trabalho está ancorado neste livro, e tem um pouco da vontade de resgatar
o desejo do que é ser um povo brasileiro, esse povo ainda em formação”, conta
Wildson. Ele criou a expressão “ninguentude”,
a partir do termo cunhado por Darcy no livro – ninguendade –, a qualidade do brasileiro primordial, filho de pai
europeu e mãe indígena. “Este primeiro brasileiro não tinha pai e não tinha
mãe”, explica Wildson. “Pela cultura dos povos originários, quem deveria cuidar
desse ser era o pai, que estava na Europa e achava que a mãe seria a
responsável. Nasce este primeiro brasileiro sem saber quem era, Na margem de
ser alguém e ser ninguém. Não era indígena
nem europeu. Um ser em formação”. Aos catorze anos, quando morreu sua avó que o criou, Hal Wildson viu que
“tinha que se virar e estudar, para me livrar dessa ideia de ser fadado a ser
ninguém, esta sina”. “Nesse
ponto a minha história e a visão crítica de Darcy Ribeiro sobre a história e
formação do Brasil se encontram: ‘como um filho sem pai e sem mãe pode ser
alguém e fugir da ninguendade. Assim
também foi o ‘primeiro brasileiro’: filho de 'ninguém', fruto da violência”,
diz. “O entendimento da ninguendade
e a busca pela identidade, através desses documentos que delimitam a nossa
história, marcam a minha jornada individual e se transforma em pesquisa
artística na medida em que a arte se torna um plano de reescrita e escrita da
história e retomada de identidade para existir-resistir à ‘ninguentude’”.
RE-UTOPYA
Uma fotografia de uma criança enrolada
na bandeira brasileira em cetim onde se lê “Re-Utopya”
bordada no centro, ao invés de “Ordem e Progresso”, recebe o visitante na
exposição. Com 100 x 67 cm, a obra “Re-Utopya
– Estrada para Pindorama” (2021), terá
parte do valor de sua venda revertida para a aldeia Rio Silveira, da etnia guarani mbyá, em São Sebastião, litoral
paulista. Foi lá que a fotografia foi feita, e onde o artista teve a ideia de “Re-Utopya”, que lhe apareceu em um
sonho, e atravessa toda sua produção recente.
“Criei a bandeira ‘Re-Utopya’,
em cetim, e levei pra lá para fotografar. Não porque eram indígenas, mas porque
era a família que me acolheu naquele momento. A família que eu queria projetar esse futuro de Brasil.A madrinha e
o padrinho estavam fazendo massa de barro para retocar a parede. Era um dia
tranqüilo, uma vida tranqüila, digna, plantando, colhendo. Queria este
sentimento. Como a ideia surgiu lá, eu queria fazer as primeiras fotos lá”,
explica Hal Wildson.
No início de 2020 ele se mudou para São Sebastião, e em seguida foi
surpreendido pela pandemia. Ali tomou contato com a aldeia Rio Silveira, ao
levar apoio e alimentos para as famílias indígenas, junto à Rede Brotar. Fruto
de uma família destruída pela cultura violenta, “coronelista”, do Vale do
Araguaia, onde era comum ter grupos familiares envoltos em abusos sexuais,
vícios, abandono, Hal Wildson se sentiu acolhido na aldeia tupi-guarani, onde
ganhou uma família – “um padrinho, uma madrinha, afilhados” – e foi batizado,
recebendo o nome “Tupã Mirim”. Ele já havia convivido com indígenas no
Araguaia, terra do povo xavante, invadido e vitimado pelo garimpo. “Eles eram
muito discriminados, pois já existia o abandono social na cidade. Eu como
criança não sabia por que se dava aquilo. Depois entendi que era por causa do
garimpo, pela forma como a cidade se estruturou”, lembra.
TEKO PORÃ E UBUNTU
Na aldeia tupi-guarani em São Sebastião, ele sonhou com a expressão Re-Utopya escrita em urucum e dendê,
e“da palavra e seu simbolismo vi uma bandeira do Brasil, mas entre as estrelas
se escrevia: ‘tekoporã e ubuntu’,
substituindo o slogan positivista ordem em progresso”. “Resumidamente, tekoporã
expressa o bem viver em comunidade,
uma busca por equilíbrio nas relações entre as pessoas e o meio ambiente, capaz
de compreendê-lo como um ser vivo e ativo. Ubuntu significa ‘eu sou porque nós
somos’. Eu sou humano, e a natureza humana implica compaixão, partilha,
respeito, empatia”, escreveu o artista em dezembro de 2021, no Manifesto Re-Utopya. Daí pensou que, se
não era mais possível apagar o passado do país, que fosse possível sua
reinvenção.
“MONUMENTO
À INDEPENDÊNCIA” (2020/2022)
Tendo como fundo uma parede vermelha, a instalação “Monumento À Independência” (2020/2022) é composta por cinco obras,
que são releituras de bandeiras do Brasil que já existiram ou ficaram como
projetos. “Pra quem é esta independência?”, questiona o artista. “Recrio essas
bandeiras com uma ideia de tentar atualizar esse projeto de Brasil em andamento.
O que nesses últimos 200 anos o Brasil tem de fato lutado para se tornar
independente? A liberdade chegou pra quem no Brasil? Quando ele se tornou
independente no século passado foi pra se tornar uma monarquia, e ainda tendo
pessoas escravizadas, enquanto muitos países se tornaram independentes já como
uma república. Isso diz muito sobre a nossa história. Esse colonialismo se
perpetuou na república, e ajudou que se tornasse a república da desigualdade,
que também é um tema dos meus trabalhos”, diz.
“Olho para o passado colonial do Brasil e vejo como esse projeto nos fez
chegar ao Brasil de agora. É esse Brasil que tem a corrupção, que tem as
milícias, violência, garimpo tirando terras indígenas”, salienta. “Por isso
utilizo esse símbolo das bandeiras, que também é uma metáfora sobre como, nesse
momento de crise de identidade do Brasil, levantar bandeira se tornou uma forma
de tentar lutar contra esse passado, e quem sabe construir um futuro mais
justo”.
“RE-FLORESTAR UTOPYA” (POLÍPTICO,
2022)
Enquanto no “Monumento à
Independência” o artista reflete sobre o passado, “nessa distopia de a
gente estar vivendo este passado agora, colonial”, em “Re-FlorestarUtopya”o olhar é para o futuro. “Tenho o passado que
eu quero transformar, e não tem como construir o futuro melhor sem olhar para o
passado. Olho para este passado e ao almejar o futuro utópico eu crio a
Re-Utopya”, explica Wildson.
Ele conta que levou a bandeira “Re-Utopya” para o Parque da
Independência, “esse lugar onde simbolicamente foi proclamada a independência,
‘às margens do Ipiranga’”, hasteou a bandeira em uma árvore plantada no Parque,
e fotografou e filmou ao longo do dia. Depois ele fez intervenções em nanquim
sobre as fotografias, desenhando raízes em preto e vermelho, “mais uma vez
fazendo analogias ao teko Porã e Ubuntu,
que são essas raízes que quem sabe podem transformar o Brasil em um país mais
justo”. “Baseado nessas filosofias e não em ordem e progresso”, reafirma.
SÉRIE “AFLUENTES”
Nesta série, iniciada no ano passado e produzida até hoje, Hal Wildson
cria quatro pinturas em acrílica sobre papel, com 110 x 110cm, em que rostos de
brasileiros negros e indígenas ocupam mapas do Brasil. “Quando se pensa na
independência, o riacho do Ipiranga se torna esse rio simbólico, esse lugar de
água simbólica onde foi proclamada a independência, uma analogia do que de fato
foi”, observa. “Penso quantos rios,
córregos e águas não eram lugar de resistência neste período, mas que foram
apagados dessa história? Nossa independência, por mais que tenha sido
proclamada por um rei, uma elite branca, foi também uma independência em que
existiu muita luta e muita resistência. Por isso falo desses afluentes, e dou
nome pras obras dos rios que alimentavam aldeias e quilombos, trazendo à tona
de como a importância dessa resistência também foi primordial da independência
do Brasil. Não só daquela época. A construção de uma independência que está em
processo de ser, pois o país não é um lugar justo para todos”.
As obras desta série que estarão expostas se chamam “Rio Juruena”, “Riacho
Açucena”, “Rio Araguaia”, e “Rio
Bacaxá”.
“SEMENTE DO FUTURO” (2021/2022)
No canto da galeria, Hal Wildson vai plantar uma muda de urucum, e na
parede estará escrito um verso seu, que acompanha muitos de seus trabalhos: “É na memória que plantamos a semente do
futuro”. Esta obra “olha” para todas as demais expostas, criando uma
conexão com todas elas. “É importante olhar pra essa raiz ancestral para
entender que a construção de um futuro depende disso. De como o esquecimento é uma violência. Lembrar-se das coisas é a única
forma de plantar o futuro”, afirma o artista.
“É por isso que planto um pé de urucum, pra trazer à tona a importância
de olhar para o nosso passado ancestral e entender que a luta continua, que a
história está sendo feita ainda. Se eu falo de utopia, não tem como não falar
dos povos originários da terra porque
são eles que garantem o futuro da terra. De como é importante falar sobre a
demarcação das terras indígenas no Brasil, porque sem as terras indígenas, sem
os povos indígenas, não existe futuro, não existe mais Brasil”.
“UTOPIA ORIGINAL”
(MÁQUINA DE ESCREVER), 2021
Maior trabalho já feito pelo artista, “Utopia Original” (2021) tem
180 x 336 cm, e a imagem da multidão
em uma manifestação acenando bandeiras foi feita com datilografia à máquina de escrever sobre 384 folhas de fotocópias de páginas
do livro “O povo brasileiro: a formação e o sentido do Brasil”, de
Darcy Ribeiro. Hal Wildson criou a imagem a partir de várias
fotografias de manifestações no Brasil, e ressalta que também está presente
nesta obra o “pensamento da identidade e
da ninguentude”.
Ele afirma que “o esquecimento é
a pior das violências porque te tira o passado e te tira também o futuro”.
“A Anistia no Brasil vem com uma violência, ela obriga a gente a esquecer o
passado. A máquina de escrever entra como esse objeto simbólico, para falar
desse passado recente do Brasil, a ditadura, especialmente, mas também por ter
sido, por décadas um instrumento para criar documentos e criar identidades do
povo brasileiro. O processo desse objeto feito para escrever se adequa
perfeitamente ao meu trabalho, porque consegue resumir essa questão da
identidade, da história, e da reescrita. Meu trabalho também fala sobre como
olhar para o passado, e reescrever a possibilidade de um futuro”.
O laborioso processo de construção das obras dessa série, idealizada em
2018, e realizada pela primeira vez em 2019, tem sua “inteligência técnica”
vinda do bordado ponto cruz, que o
artista aprendeu a fazer com sua avó. “Quadradinhos que você vai juntando e
criando imagens, quase que pixels”. “Para criar as obras com a máquina de
escrever eu faço isso ao extremo. Primeiro faço um tipo de molde, onde eu sei
onde vai ser o vermelho e o preto. Tudo letras. Faço um esboço em um papel e
vou marcando onde vai ser cada área de cor. Como faço várias camadas, uma vai
apagando a outra, que é uma metáfora do fato histórico, que um vai se
sobrepondo a outro, vai criando uma nova realidade. Você apaga uma coisa e cria
uma memória em cima do apagamento, do esquecimento, que tem muito a ver com
essa linguagem poética do meu trabalho”. “Para ficar o vermelho intenso ou o
preto intenso, vou fazendo mais de oito camadas de letra no mesmo lugar, até
conseguir preencher. Por exemplo, em uma camada eu repito memória, palavra e esquecimento. Em outra eu coloco letras
aleatórias para preencher os espaços vazios, e vou repetindo até conseguir de
fato criar a cor, a luz, cor, o contorno”.
Ele utiliza ainda um carimbo criado com a tipografia da máquina, para
“aprofundar determinadas palavras, e acelerar o processo de criação”.
SOBRE HAL WILDSON
Artista
multimídia e poeta mestiço, nascido em 1991 no Vale do Araguaia , região
de fronteira entre Goiás e Mato Grosso, Hal Wildson é conhecido pela
pesquisa que envolve conceitos de escrita, identidade e a reconstrução de
memórias coletivas e autobiográficas, atravessadas por questões sociais e
políticas. A pesquisa sobre memória e esquecimento é a base de um trabalho que
investiga a criação de territórios narrativos por meio de símbolos e documentos
usados como ferramentas de construção e reconstrução no campo pessoal e
coletivo.
“Sou
instigado por coleções documentais, técnicas escritas e materiais de
documentação, pois acredito que os documentos são objetos que permitem a
criação de narrativas simbólicas da memória, na esfera pessoal, criando ficções
sobre a própria existência e em larga escala na fabricação da história de uma
nação, uma vez que cada memória carrega consigo o peso do esquecimento – o que
estamos esquecendo de contar?”
SOBRE
DIVINO SOBRAL
Divino Sobral nasceu em Goiânia, em 1966, onde vive e
trabalha como artista e curador independente. Recebeu as premiações de
curadoria do Salão Anapolino de Artes (2017) e Prêmio Marcantonio Vilaça CNI
SESI SENAI (2015); prêmio de Crítica de Arte do Situações Brasília Prêmio de
Artes Visuais do DF (2014); Prêmio Marcantonio Vilaça MinC-Funarte (2009).
Entre 2011 e 2013 foi diretor do Museu de Arte Contemporânea de Goiás. Publica
regularmente textos sobre arte brasileira em revistas acadêmicas, livros, catálogos
e jornais.
Serviço – Exposição “Hal Wildson – Re-Utopya”
Galeria Movimento, Gávea, Rio de Janeiro
Abertura: 9
de junho de 2022, das18h às 21h
Até: 30 de julho de 2022
Entrada gratuita
Apoio: Becks
Rua dos Oitis, 15, Gávea, CEP 22451-050, Rio de Janeiro, RJ