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Exposição "Dois pra lá, dois pra cá" de Mano Penalva
Exposição

Exposição "Dois pra lá, dois pra cá" de Mano Penalva

Exposição

  • Nome: Exposição "Dois pra lá, dois pra cá" de Mano Penalva
  • Abertura: 07 de março 2024
  • Visitação: até 20 de abril 2024

Local

  • Local: Simões de Assis
  • Evento Online: Não
  • Endereço: Alameda Dr. Carlos de Carvalho, 2173 A - Batel, Curitiba - PR

Em Dois pra lá, dois pra cá, exposição individual de Mano Penalva (Salvador, 1987) em Curitiba, o artista apresenta obras que apresentam o deslocamento como protagonista, a amalgamar os trabalhos com os espectadores.

Penalva referencia primorosos sistemas estéticos de origem popular, assim como sobrescreve um incontornável legado da arte cinética, sobretudo do modernismo latino-americano. Em uma geometria dinâmica, encontra diálogos bem humorados e políticos, com vínculos do bolero à fenômenos ópticos.

Uma das possibilidades de revisão da história social do Brasil apresentase através de uma história do movimento. Polivalente, esse movimento pode acontecer de inúmeros modos: migrações populacionais, variações de maré, dinâmicas comerciais e de troca e, próprio ao corpo cultural, a dança. Apesar das variantes sedutoras, opto por manter esta investigação historicamente próxima ao “movimento”, pela insubordinação que o próprio fenômeno carrega consigo em relação ao desapego disciplinar e à liberdade de deslocamento no pensamento


Em Dois pra lá, dois pra cá, exposição individual de Mano Penalva em Curitiba, é a tentação do olho que comanda o deslocamento, que ativamente distorce a imagem fruída ao passo que o espectador se move no espaço. As salas expositivas, idealmente neutras, tornam-se um diagrama de coreografias planejadas pelo artista. Nas obras da série Ventana, produzidas com ripas de madeira multicoloridas, é como se cada canto assobiasse, chamando para mais perto, em disputa com os chamarizes em si mesmo. Os trabalhos demonstram uma repulsa à frontalidade, a um ponto de vista único, hermético e pré-fixado, questão amplamente discutida pela prática escultórica contemporânea. Ambíguo, os objetos tridimensionais de Penalva se apresentam camuflados de pinturas postos à parede; sem a intenção do engano, mas com o truque do fascínio. A apontar para uma crise de classificação em um mundo de objetos e nomes cambiantes, o trabalho engendra compreensões intervalares em sua própria natureza.


Penalva incentiva uma observação livre da forma, pautada pelos apetites sensoriais a serem saciados através do movimento em diversos ângulos, em mudanças completas de cor e composição em determinadas posições. Com esses trabalhos, portanto, o artista propõe ao espectador uma insinuação de dança defronte às obras: dois pra lá, dois pra cá. Tal movimento pendular, como as contas de um ábaco – ou como seus Alpendres que balançam ao vento –, joga pontos de referência a primorosos sistemas estéticos de origem popular, assim como sobrescreve um incontornável legado da arte cinética, sobretudo do modernismo latino-americano. Esse resíduo histórico que acompanha a produção de Penalva é análogo ao ruído visual causado pelos trabalhos apresentados, onde fenômenos ópticos – como o moiré – se intensificam e se acumulam na retina de quem absorve os trabalhos, impregnando o próximo trabalho com o zumbido do anterior.


Desse modo, Penalva reverencia a sofisticação de vocabulários visuais igualmente populares – e, por consequência, suas epistemologias e relações sociais –, como na composição de elementos da arquitetura vernacular, na composição de bancas de feira com lonas e caixas de madeira, na diagramação de cartazes com letras pintadas manualmente.


As ventanas guardam semelhanças com os aparatos arquitetônicos postos em vãos de janelas e portas que permitem o fluxo de ar ao mesmo tempo que bloqueiam a incidência solar. Tal solução formal, criada em países com climas desafiadoramente quentes, apresenta diversidade caleidoscópica de formas e combinações de padrões geométricos – como em cobogós, muxarabis, venezianas e persianas. Pedindo o inverso do que o objeto que as geram propõe, as Ventanas de Penalva pedem ao espectador que as descortinem, que as esguelhem, que as desvelem em soslaio.


Essa geometria dinâmica encontra diálogos bem humorados: em Beijo, por exemplo, a parábola formada pelo tenso peso da fiada de contas encontra, em uma carícia tangente, o arco côncavo da forma circular pintada em acrílica sobre madeira. Essa espécie de colar de miçangas, além de sugerir conexões religiosas e espirituais densamente ocorrentes nas visualidades populares, fazem cócegas no conceito do ornamento, presença temida pelo modernismo minimalista. Em Beleba, esferas imantadas que sugerem divertidas bolinhas de gude, comuns em brincadeiras e rua, também simbolizam campos de troca, de conquistas e de estratégias1. Visualmente, inserem pontos visuais marcantes em meio ao ritmo vertical, como semibreves em uma partitura rotacionada.


Ao intitular a mostra como Dois pra lá, dois pra cá, o artista desvia o movimento para a dança, e alguns pilares fulcrais bailam no horizonte: a relação intrínseca com a música; a corporificação de expressões culturais das mais diversas, miscigenadas, transpostas e reconfiguradas; a dimensão afetiva; e a efemeridade da dança, que só acontece em determinado momento e, quando se repete, é sempre nova, embora repita uma tradição. A dança é, portanto, inexata em suas recorrências, tenha o mesmo princípio medidor, uma matriz de instruções comum.


Quadris, ombros, pés e mãos obedecem a cantos inteligíveis que ativam corpos sensíveis, cuja inteligência corporal é mestra. Há, por certas matrizes, uma tentativa de esquematização dos movimentos da dança, de modo a controlá-lo, reproduzi-lo em intentos disciplinares, geométricos, científicos. Ironizar a tentativa de ensinar alguém a ter molejo foi uma das intenções centrais de Andy Warhol na série Dance Diagram (1961- 1962), onde a sinuosidade e espontaneidade dos movimentos dão lugar a linhas duras e vetoriais que instruem sobre o movimento dos pés2. Nas ocasiões em que trabalhos dessa série eram expostos – em lugares onde ver pessoas dançando causa estranheza, como museus e galerias de arte –, eram raras as vezes em que os observadores não tentavam replicar as instruções defronte às obras.


Em Dois pra lá, dois pra cá, Mano Penalva propõe uma ativação similar: em uma sala com paredes em tom mais quente, ecoa um bolero que incentiva os visitantes à dança. As duas caixas de som sobre tripés, defronte aos grandes Alpendres que lavam as paredes do teto ao chão, sugerem dois corpos que, em par, somam-se à dança. A instalação sonora Bolero para o silêncio – composta por Penalva e pelo produtor musical Meno Del Picchia –, além de atentar para os hibridismos culturais da América Latina, suas influências hispânicas e resistências originárias e diaspóricas, disserta sobre a importância do intervalo: a pausa que intercala os passos é tão importante quantos os elementos cheios. Maestro é quem domina o tempo, determina o ritmo e dispõe as frestas na completude. Cercado de obras que privilegiam a apreensão visual em detrimento a outros sentidos, Bolero para o silêncio amalgama-se com o observador em um processo de ignição do corpo através da audição.


Nota-se, portanto, uma inexatidão nas práticas da dança: embora haja um decoro que as rejam, cada uma acontece de modo específico, dentro de um parâmetro convencionado. Essa matemática orgulhosamente inexata, descompassada pela generosidade, tende sempre ao transbordamento, a um pouco a mais: surge, assim, a obra Um tanto e meio. Penalva questiona se esse sistema de medida pautado pela partilha não se faz mais pertinente nas relações humanas do que a escala de unidade métrica, onde, em frieza tal, o que determina o que é medido é o comprimento de raios de luz no vácuo em um intervalo mentalmente incompreensível.


Embora as medidas representem uma lata de um litro e uma de meio litro – empírica, sábia e precariamente apropriadas da produção industrial, ao reutilizarem latas metálicas de óleo de cozinha como recipiente para medida de grãos e farinhas em feiras públicas –, Um tanto e meio indaga acerca da arbitrariedade dessas convenções: não se sabe quanto faz um tanto ser um tanto, muito menos meio. A obra propõe uma alternância, sempre dinâmica: de um lado, o cheio intransponível, como esculturas maciças de Iran do Espirito Santo que não servem para medida alguma; ou o vazio presente, como nas moedas sem valor de Cildo Meireles. Os objetos em si nada valem, mas pautam o valor das coisas que medem e trocam.


Existem virtualmente, em potência. Com conteúdo mutável, podendo ser preenchidas com matérias dos mais diversos valores, Um tanto e meio enfatiza a dinâmica da troca. Além disso, indaga se propor possibilidades centradas na generosidade nas dinâmicas capitalistas não são encenações utópicas.


Complica-se ainda mais quanto as etapas produtivas são subvertidas pelo paulatino abandono da reutilização das latas industriais, passando a produzir artesanalmente – e vender – novos utensílios medidores com volumes aproximados. Assim, reitera-se um deslocamento central: um instrumento de medida passa a ser de representação, em uma ciranda cruzada entre imagem, objeto e significado. Ao mesmo tempo que se referem a uma prática dada, Um tanto e meio independe dos objetos que a constituem, posto que (in)citam, em senso estrito, os movimentos feitos por outras latas que não aquelas. Incentivando os mecanismos imaginativos, Penalva sugere a possibilidade sonora dessas latas quando cheias, como chocalhos que cumprem a percussão do bolero, a soar o ritmo do cotidiano, o barulho das feiras, o som do baile.


- Mateus Nunes


Notas
1 Vale aproximar à discussão entre linguagem, jogo e política, proposta por Waltércio Caldas na exposição A natureza dos jogos (MASP, 1975), sobretudo no trabalho A origem do futuro (1972).
2 Warhol satirizava um compêndio estadunidense publicado na década de 1950 que prometia instruções caseiras para aprender a dançar de forma fácil, como nos livros Fox Trot Made Easy [Fox Trot facilitado], Tango Made Easy [Tango facilitado], e The Easy Way to Good Dancing [O jeito fácil para dançar bem], publicados pela Dance Guild, Inc.


SOBRE O ARTISTA

Mano Penalva (Salvador, 1987) transita por diversas linguagens, como instalações, esculturas, pinturas, vídeos e fotografias. Artista visual, formado em Comunicação Social pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (2008), frequentou cursos livres da Escola de Artes Visuais do Parque Lage entre 2005 e 2011. Atualmente mantém seu ateliê em São Paulo, cidade que também abriga o Massapê Projetos, plataforma idealizada por ele, gerida por artistas que possibilita o pensamento e produção de arte.


Em sua pesquisa, Penalva busca investigar a formação da cultura brasileira e suas manifestações variadas. Um dos procedimentos utilizados em seu trabalho é o deslocamento preciso e incomum de fragmentos e objetos do cotidiano, muitas vezes reutilizados e apropriados, refletindo o interesse do artista pela antropologia e cultura material. Seus trabalhos operam em diferentes meios, desde a forma cotidiana da construção urbana, passando pelo uso decorativo e prático dos objetos que refletem as realidades socioeconômicas e culturais do povo brasileiro, até instalações na natureza e ações performáticas. Para o artista, tudo pode ser fonte de pesquisa, tendo mercados, ruas e casas populares como seus objetos de estudo. Mas é no gesto – escultórico, apropriativo, da costura, da colagem, – que ele busca entender as nuances de separação e sobreposição entre arte e vida.


Nos últimos anos participou de diversas residências artísticas, como Casa Wabi, Puerto Escondido (2021); Fountainhead Residency, Miami (2020); LE26by, Felix Frachon Gallery, Bruxelas (2019) e AnnexB, Nova Iorque (2018). Dentre suas exposições individuais, destacam-se: “Sala de estar” (2023-2024), Museu de Arte Moderna Aloisio Magalhães (MAMAM), Recife; “De Costa a Costa” (2023), Instituto Guimarães Rosa, Cidade do México; “Cumeeira” (2023), Simões de Assis, São Paulo; “Cama de Gato” (2022), Llano Galeria, Cidade do México; “Alpendre” (2022), Galeria Portas Vilaseca, Rio de Janeiro; “Entre les Plis” (2022), Felix Frachon Gallery, Bruxelas; “Ode ao vento” (2021), Llano Galeria, Oaxaca; “Hasta Tepito”, B[X] Gallery, Brooklyn (2018); “Requebra”, Frédéric de Goldschmidt Collection, Bruxelas (2018); e “Proyecto para Monumento”, Passaporte Cultural, Cidade do México (2017). Dentre as exposições coletivas, integrou: “What I really want to tell you...” (2020), MANA Contemporary, Chicago; “Tropical Gardens” (2019), Felix Frachon Gallery, Bruxelas; “Bienal das Artes” (2018), SESC Distrito Federal, Brasília; “Blockchain/ Alternative barter: a new method of exchange?” (2018), B[x] Gallery, Brooklyn; e “L’imaginaire de l’enfance” (2015), Cité Internationale des Arts, Paris. Possui trabalhos em instituições como CIFO - Cisneros Fontanals Art Foundation, Miami; Frédéric de Goldschmidt Collection, Bruxelas; GALILA’S P.O.C., Bruxelas; Fundação Casa Wabi, Oaxaca, México; PAT Art Lab, Augsburg; e Museu de Arte do Rio de Janeiro.


SERVIÇO
Simões de Assis
abertura: quinta-feira, 07 de março, 18h às 21h
período: 07.03 - 20.04.2024
segunda a sexta, 10h às 19h

sábado, 10h às 15h
Curitiba

Al. Carlos de Carvalho, 2173 A
80730-200 | Paraná | Brasil
@simoesdeassis_


IMAGENS
Domo, da série Ventana, 2024 ripas de madeira, faixa de nylon, tinta esmalte e chassi, 80 x 120 x 5cm
Bisel V: como arredondar quinas, 2023 miçangas de madeira, argolas de metal, fitilho, fio de aço e pregos, 230 x 160 x 110cm
Veleiro, da série Ventana, 2024 ripas de madeira, faixa de nylon, tinta esmalte e chassi, 136 x 132 x 5cm



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