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Exposição "Alberto Pitta: eternidade soterrada"
Exposição

Exposição "Alberto Pitta: eternidade soterrada"

Exposição

  • Nome: Exposição "Alberto Pitta: eternidade soterrada"
  • Abertura: 07 de maio 2022
  • Visitação: até 30 de junho 2022

Local

  • Local: Carmo Johnson Projects
  • Evento Online: Não
  • Endereço: Rua Silvio Portugal, 193, Pacaembu

ALBERTO PITTA: ETERNIDADE SOTERRADA

Renato Menezes

fios, panos, dobras


“Quem conhece o ontem e o hoje, conhecerá o amanhã, porque o fio do tecelão é o futuro, o pano tecido é o presente, o pano tecido e dobrado é o passado”, diz um provérbio fulâni¹, que se aplica, com inusitada precisão, aos procedimentos artísticos de Alberto Pitta. Há quatro décadas envolvido com a produção de serigrafias e estampas que colorem os desfiles dos mais emblemáticos blocos do carnaval negro-baiano, Pitta tem com os fios, os panos e as dobras a mais profunda intimidade, construída diariamente ao longo de sua vida. Observando as atividades de sua mãe, Mãe Santinha de Oyá, importante yalorixá de Salvador, que se dedicava aos bordados richelieu e à educação das crianças e adolescentes da comunidade de Pirajá – seguindo a vocação comunitária do candomblé –, Pitta viu desde cedo despertar seu interesse pelos panos e seu compromisso em agregar pessoas através das palavras. Rapidamente ele entendeu que na tradição africana, da qual descende, a roupa não responde somente à necessidade utilitária de proteger o corpo; ela poderia ser igualmente um poderoso elemento significante, que inscreve o homem na natureza e o reconecta a seus ancestrais, afirmando-se como suporte da linguagem e dos marcadores sociais².


De fato, signos, formas e traços que evocam grafismos tradicionais africanos encontraram, sobre seus tecidos, um lugar privilegiado de educação das massas e de contação de histórias que só fazem sentido coletivamente. Se a escrita, na obra de Pitta, se organiza no conjunto de padrões e cores que reinterpretam a cosmovisão yorubá, a leitura, por outro lado, diz respeito à relação estabelecida no contato entre corpos em movimento, quando as ruas da cidade viram terreiro³. Pelas dobras dos tecidos que cobrem os foliões percorre um alfabeto de letras e afetos, mobilizados pela música e pela dança: é no corpo do outro que se lê o texto que nos completa. É no tecido estampado onde Pitta fortalece o princípio dos bantos, segundo o qual o ser não existe em oposição ao outro, mas no contato com aquilo que, no outro, possa lhe alterar em busca da constante renovação do sentido da vida enquanto experiência de beleza, alegria e liberdade4. “Eu escrevo até mesmo para quem não sabe ler”, diz Pitta, como quem faz prelúdio ao célebre verso de Roberto Mendes e Capinan: “vou aprender a ler pra ensinar meus camaradas”. Por isso, as palavras podem se tornar indecifráveis ao público letrado, enquanto os símbolos – máscaras, pentes, adinkras, animais, cabaças, búzios, objetos rituais –, os mais sofisticados hieróglifos sob os olhos de um iletrado. A estampa se torna, portanto, um ativador do encontro, um dispositivo de comunhão, de ligação entre dois mundos, de intercessão das flechas do tempo. Assim, o pano tecido e dobrado (que é o passado) é constituído de múltiplas possibilidades de futuros, os fios do tecelão.


A trama justa formada pelos fios do tempo, que acomoda a iconografia em torno da qual a obra de Pitta gravita, é traduzida no título da exposição. Inspirado em um verso do poeta baiano Waly Salomão, “eternidade soterrada” remete, por um lado, às pinturas rupestres e aos fósseis, esses resquícios do passado cristalizados no presente, que desafiam a finitude da vida e enfatizam a transformação da matéria. Essa dimensão arqueológica de sua obra se manifesta no acúmulo de camadas de cores e formas – resultante do poder da serigrafia em transformar rastro em grafo –, no trabalho com tons amenos e terrosos e na frequente alusão às pátinas e erosões provocadas pelo tempo. Por outro lado, o título remete também à alegria sufocada no ambiente doméstico, em tempos de isolamento pandêmico, período durante o qual o conjunto de obras aqui apresentado foi realizado.



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